A fitofotodermatite consiste numa dermatose por exposição combinada a uma planta fotossensibilizante e a radiação ultra-violeta. Embora seja rara, a sua incidência tem aumentado. Este relato ilustra um caso de fitofotodermatite pós-exposição à lima.
Doente do sexo feminino, 6 anos. Quadro de placas lineares hiperpigmentadas, com 5 dias de evolução. Após colheita de anamnese exaustiva, apurou-se que a criança havia cozinhado uma tarte de lima, com conseguinte exposição solar. O seu irmão apresentava lesões semelhantes. Houve resolução do quadro após um mês.
A fitofotodermatite induzida pela lima é ainda pouco reconhecida. As conformações peculiares na pele e a ubiquidade dos agentes envolvidos podem levar a um diagnóstico errado de abuso infantil. Uma anamnese e exame físico exaustivos são cruciais. Importa consciencializar os médicos acerca desta patologia, para garantir a segurança dos pacientes e tranquilização da família.

A síndrome de Ramsay-Hunt (SRH) caracteriza-se como uma infeção do gânglio geniculado do nervo facial pelo vírus varicella zoster (VVZ) e apresenta-se pela tríada de otalgia, erupção vesicular da concha auricular e paralisia facial periférica ipsilateral. O envolvimento de outros pares cranianos é raro, mas pode trazer dificuldade e atraso diagnóstico e um mau prognóstico.
Apresentamos o caso de um doente com SRH e extensão a polineuropatia afetando o V, VII, VIII, IX e X pares cranianos e consequente sintomatologia que motivou internamento hospitalar prolongado e uma abordagem multidisciplinar de diferentes especialidades médicas. Apesar do mau prognóstico, apresentou uma significativa recuperação clínica e radiológica.
A prevenção e a atenuação do VVZ e das suas complicações são cada vez mais possíveis e o aumento do conhecimento sobre a doença para a população e para os clínicos poderá ter impacto significativo.

Introdução: A infeção urinária (IU) é uma das infeções bacterianas mais comuns em pediatria, com amplo espectro de manifestações clínicas, podendo traduzir-se no evento sentinela para anomalias congênitas do trato urinário. Pela sua relevância em âmbito de urgência, representando 5% a 10% das febres sem foco, pretendeu-se caracterizar o processo de colheita e testagem das amostras de urina de doentes com suspeita de IU num Serviço de Urgência Pediátrica (SUP).
Métodos: Revisão retrospetiva das uroculturas colhidas no serviço entre março de 2020 e janeiro de 2024.
Resultados: Foram realizados 745 rastreios urinários, com uma idade mediana de 2,8 anos, 60,7% dos quais do sexo feminino. O processamento da amostra demorou em média 1,3±0,6 dias. A taxa de positividade em métodos assépticos foi de 17,4%, variou entre 23% para jato médio e 50% para punção vesical. Ainda que a Escherichia coli tenha sido o isolamento mais frequente (70,7%), foi uma das que teve mais resistência à amoxicilina/ácido clavulânico (33%). Outros gérmenes isolados foram: Proteus em 20,7%, Staphylococcus saprophyticus em 2,3% , Klebsiella e Enterococos em 1,5% respetivamente e outros germes em 2,3%. A resistência à cefuroxima foi observada em 1,5%.
Conclusão: Nesta casuística, a E. coli continua a ser o patógeno predominante na IU e o aumento da resistência às penicilinas na nossa população é preocupante. A cefuroxima é uma opção efetiva no tratamento empírico da IU.

Introdução: A população portuguesa está em processo de envelhecimento, pelo que as necessidades paliativas deverão estar previsivelmente a aumentar. Uma das barreiras ao acesso atempado de cuidados paliativos é a dificuldade na identificação dos doentes que poderão beneficiar deles. Estes doentes estão sobretudo na comunidade. Assim, as equipas de cuidados de saúde primários estão na melhor posição para identificar doentes com potenciais necessidades paliativas.
O nosso objetivo foi avaliar as necessidades paliativas numa Unidade de Saúde Familiar (USF) do Concelho de Matosinhos.
Métodos: Estudo observacional transversal numa amostra de utentes com idade igual ou superior a 65 anos de uma USF do Concelho de Matosinhos, através da aplicação da escala de avaliação de necessidades paliativas – SPICT-PT™.
Resultados: A amostra foi constituída por 349 utentes, 56,4% do sexo feminino e 43,6% do sexo masculino. A mediana de idades foi de 74 anos. O grupo patológico mais prevalente foi do aparelho circulatório, seguido do grupo de doenças endócrinas e as doenças oncológicas. Foram identificados 25 (7,2%) doentes com necessidades paliativas. Estes apresentam uma mediana de idade superior assim como um grau mais elevado de dependência. Este grupo apresenta um número maior de doenças do aparelho circulatório, do foro psicológico e do foro oncológico. Dos doentes com necessidades paliativas, 6 (24%) estavam referenciados à equipa de cuidados paliativos.
Conclusão: A identificação de 7,2% de doentes com necessidades paliativas é semelhante à referida noutros estudos. O baixo número de referenciação de doentes com necessidades paliativas à equipa de cuidados paliativos pode dever-se a uma manifesta dificuldade dos médicos de família na identificação destes doentes ou ao facto de os doentes estarem sintomaticamente controlados e serem de baixa complexidade. A divulgação e aplicação da ferramenta SPICT-PT™ nos cuidados de saúde primários poderá ser uma mais-valia na melhoria da identificação destes doentes, conhecimento, prestação e planeamento de cuidados a vários níveis.

Este artigo tem por objetivo sensibilizar para o devido preenchimento dos registos médicos no processo clínico, discutindo as diversas repercussões médico-legais que estas informações representam não só na evolução clínica, como também na elaboração dos relatórios periciais e na documentação médico-legal pelo que esta representa em Tribunal, em sede de avaliação do Direito Penal, do Direito do Trabalho, do Direito Civil entre outros.

A visão computacional emergiu como sendo uma tecnologia transformadora com o potencial de melhorar significativamente a segurança, eficiência, precisão e formação na prática cirúrgica. Aproveitando algoritmos avançados e inteligência artificial, as aplicações de visão computacional oferecem uma análise em tempo real sobre informação visual durante os procedimentos cirúrgicos, permitindo o suporte à decisão automatizado, avaliação de desempenho e orientação intraoperatória. Este artigo explora os desenvolvimentos recentes na tecnologia de visão computacional no domínio da cirurgia, com um foco particular na sua aplicação em procedimentos minimamente invasivos. Discute também o estado atual da visão computacional na cirurgia, explorando as suas aplicações práticas. O artigo destaca os desafios que devem ser superados para uma adoção clínica generalizada, enfatizando o papel crucial dos esforços coletivos para enfrentar estes obstáculos. Com um foco equilibrado tanto nos avanços técnicos como nas implicações práticas, este manuscrito fornece uma visão abrangente do papel da visão computacional na cirurgia moderna.

Homem, 25 anos, com antecedentes de doença de Crohn, sob tratamento biológico, recorre à Consulta Aberta por lombalgia aguda e pico febril. Pelo quadro de lombalgia associada a sinais de alarme é encaminhado para o Serviço de Urgência, onde realiza estudo imagiológico e analítico, com ligeira leucocitose, sem outras alterações.
Alta com diagnóstico de presunção de lombalgia sem causa secundária. O quadro clínico agrava progressivamente, com incapacidade para a marcha. É reavaliado, apresentando teste de Patrick positivo. Pede-se novo estudo imagiológico, sem alterações. Realiza ressonância magnética, sendo diagnosticado com sacroileíte infeciosa associada a extensos abcessos. Em internamento, realiza múltiplos ciclos de antibioterapia e várias tentativas de drenagem das coleções, sem sucesso. Alta após 54 dias de internamento com recuperação funcional progressiva.
O caso pretende alertar para a maior suscetibilidade a infeções associadas ao uso crescente de biológicos e para a complexidade assim acrescida no acompanhamento de doentes com doença inflamatória intestinal.

A fibromialgia afeta cerca de 1,78% da população mundial, sendo reconhecida e estudada desde o século XVI.
Apesar disso, a etiopatogenia da fibromialgia ainda é desconhecida. Consequentemente, ainda existe um debate sobre se a fibromialgia deveria ser considerada dentro da categoria de perturbações de somatização, como uma síndrome central de sensibilização à dor, ou mesmo como uma doença dos nervos periféricos. Consideramos que esta é uma questão relevante, uma vez que tem impacto na referenciação destes doentes para os diferentes profissionais de saúde, o tipo de avaliação que é realizada e as abordagens terapêuticas que lhes são propostas.
Vários aspetos apontam para semelhanças entre a fibromialgia e a perturbação de sintomas somáticos: ambos os diagnósticos compartilham alta comorbidade com várias perturbações psiquiátricas, história de trauma na infância, presença de alexitimia e outros traços de personalidade, estilos de vinculação inseguros e comorbidade com as chamadas síndromes de dor crónica sobrepostas. Portanto, levantamos a hipótese de que a fibromialgia possa ser conceptualizada como uma perturbação de sintomas somáticos. No entanto, o debate contínua, uma vez que ainda escasseia evidência científica a favor ou contra esta perspetiva. Mais estudos são necessários para desvendar a etiopatogenia destes dois diagnósticos.

Introdução: A enurese noturna (EN) tem uma prevalência de 5%-15% nas crianças em idade escolar (IE) e pode estar associada ao impacto na qualidade de vida (QdV) nas crianças e famílias. Com este trabalho, pretende-se estimar a prevalência da EN nas crianças em IE em quatro unidades de saúde familiares (USF) na região Norte e avaliar o impacto na QdV.
Métodos: Estudo multicêntrico transversal e descritivo conduzido nas USF em estudo, após aprovação pela Comissão de Ética. Convidaram-se oportunisticamente as crianças em IE, que compareceram nas consultas programadas, para preenchimento de um questionário anónimo. A análise estatística foi conduzida com recurso ao Excel^® e SPSS^®.
Resultados: Registaram-se 158 participantes, 60,1% do sexo feminino, com mediana de idades de 6 anos (IIQ 5-7). Identificaram-se 18 crianças enuréticas (11,4%), sendo que destas a maioria era do sexo masculino (66,7%), e tinha entre 5 e 6 anos (66,7%). Encontrou-se relação significativa entre EN e sexo (p=0,014), história familiar (HF) (p=0,021) e perdas urinárias diurnas (p=0,034). Relativamente à QdV (n=14), as subescalas mais afetadas foram as relações familiares, a autoestima e as relações sociais.
Conclusão: Apesar da amostra reduzida condicionar a interpretação de resultados, a prevalência de EN obtida e a associação positiva entre EN e sexo masculino e HF são concordantes com a bibliografia. Além disso, a avaliação da QdV mostrou impacto negativo nas crianças e famílias. Desta forma, salienta-se a importância da abordagem e orientação adequadas desta patologia.

O incumprimento terapêutico é deveras comum e subestimado numa população cada vez mais envelhecida e de mãos dadas com a multimorbilidade, comprometendo resultados e aumentando custos em saúde. A adesão é um processo dinâmico influenciado simultaneamente por múltiplos fatores, relacionados ou não com o doente, que devem ser considerados antes e após a prescrição e sujeitos a um acompanhamento contínuo no tempo. O adereçamento destes fatores e sua adequação individualizada, com reforço da motivação intrínseca e envolvimento do doente na estratégia terapêutica pode ser uma das medidas mais eficazes no combate das doenças crónicas e, consequentemente, na melhoria dos resultados em saúde.

A chupeta é parte integrante dos lares de todo o mundo, aquando da existência de um recém-nascido. O seu uso tornou-se um hábito culturalmente enraizado, seguido pela maioria dos pais/tutores, mas foi surgindo receio de que a utilização deste objeto tenha influência negativa no sucesso da amamentação.
Neste artigo de revisão, são apresentados os resultados mais recentes da literatura sobre a influência da chupeta na amamentação, abordando a importância da amamentação e as principais vantagens e desvantagens do uso de chupeta.
Estudos observacionais apontam uma possível correlação entre o uso de chupeta e o insucesso da amamentação, mas essa associação não se confirmou em estudos de maior robustez como em ensaios clínicos randomizados.
Face à evidência científica apresentada, os autores consideram que a chupeta deve ser oferecida, se essa for a vontade dos pais, tomando uma decisão partilhada e informada.

A asma é uma doença crónica muito frequente na infância, sendo o montelucaste utilizado no seu tratamento. Este fármaco tem sido associado a alterações neuropsiquiátricas potencialmente letais. O objetivo desta revisão é avaliar a evidência acerca dos seus efeitos neuropsiquiátricos em idade pediátrica. Da pesquisa bibliográfica resultaram 17 artigos e uma norma de orientação clínica, tendo 5 cumprido os critérios de inclusão previamente definidos. Após análise dos artigos considera-se que existe evidência da ocorrência de eventos neuropsiquiátricos em crianças asmáticas medicadas com montelucaste. Os clínicos devem estar informados acerca desta associação, para realizarem prescrições conscientes e estarem alerta durante o seguimento destas crianças. São necessários mais estudos, multicêntricos, com amostras mais robustas, com um período de acompanhamento mais prolongado e com metodologia bem definida, que clarifiquem a associação de montelucaste a eventos neuropsiquiátricos em idade pediátrica.